Nota de esclarecimento e retificação

07/12/2020 21:01

Tendo em vista manifestação do prof. Márcio Costa na última sessão do Conselho Universitário (04/12/2020) em relação à nota de repúdio aos comentários de alguns professores do CTC sobre as políticas de ações afirmativas da UFSC, em uma lista de e-mails institucional, esclarecemos que, naquela particular troca de mensagens, não há manifestação explícita do referido professor, embora haja ali referências e elogios à sua atuação no Conselho Universitário nesta matéria. Por isso, a frase “Alguns dos docentes que comentam são, inclusive, membros do mesmo Conselho e votaram favoráveis à aprovação das cotas” é imprecisa e será retirada da nota de repúdio. Lamentamos o equívoco, mas reforçamos a importância dessa nota de repúdio, quer seja, a de denuncia e de combate institucional ao racismo dentro da UFSC.

Repúdio ao racismo institucional

01/12/2020 13:23

REPÚDIO FRENTE AOS COMENTÁRIOS RACISTAS PROFERIDOS POR ALGUNS DOCENTES DO CTC/UFSC EM 20 DE OUTUBRO DE 2020, DE FORMA INSTITUCIONAL

Diante de comentários proferidos por alguns docentes do CTC/UFSC no dia 20 de outubro de 2020, por meio de lista de e-mail institucional desta universidade, viemos por meio desta carta visibilizar o ocorrido e solicitar ao reitor e a este Conselho Universitário uma posição institucional de repúdio e investigação sobre o fato.

Os comentários fazem referência a aprovação unânime por este conselho universitário do Processo nº 23080.032361/2020-20  e da RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº 145/2020/CUN, DE 27 DE OUTUBRO DE 2020 que dispõe sobre a política de ações afirmativas para negros(as) (pretos e pardos), indígenas, pessoas com deficiência e outras categorias de vulnerabilidade social nos cursos de pós-graduação lato sensu e stricto sensu da Universidade Federal de Santa Catarina.

Proferiram frases* como: “é muito triste notar que a Demagogia está vencendo a Meritocracia”; “pós-graduação é para a elite intelectual”; “cotas para pesquisa por conta da cor e da condição social é ridículo, imbecil e só envergonha quem participou desta bobagem”; “Nenhuma lei pode obrigar professores em comissão de bolsas a aprovar medíocres”, “Já afirmo que não participarei nunca em comissões de pureza racial para seleção de pós graduandos”, “Tem gente que só dando com um tacape na cabeça. Eu quero participar de uma comissão de m* destas. Para votar contra sempre. E para levar um tacape para ver se acordam com uma pancada bem dada no suposto cérebro”. Os comentários revelam, além do descumprimento do código de ética enquanto servidores públicos, um projeto de educação privatista e racista que ignora as leis, a ciência e a história do Brasil.

As políticas de cotas são políticas sociais que visam a equidade, amparadas em apontamentos científicos e legais; a ideologia da meritocracia é racista pois ignora o fato de que no Brasil não temos as mesmas condições de acesso a educação.  Nos comentários fica também evidente a compreensão dos docentes de que há uma superioridade das pós graduações e que ela é isenta de cor. Além disso, os comentários vão contra as pesquisas que mostram que os estudantes cotistas possuem melhor desempenho em comparação aos estudantes brancos. Um outro aspecto grave é que os comentários inferiorizam o trabalho sério e árduo das comissões de validação gestadas pela SAAD na UFSC, instâncias sérias e de controle social que resultam da luta de movimentos sociais e seguem as orientações do Supremo Tribunal Federal. Ignoram o fato de que estas comissões não tratam de verificação de pureza racial, pois isso não existe. São, na verdade, espaços de confirmação do pertencimento racial pela compreensão política e teórica de que no Brasil a discriminação racial que produz desigualdades é “de marca” e não “de origem”, como nos EUA, conforme explica o sociólogo Oracy Nogueira.

Segundo a Lei Nº 12.288, DE 20 DE JULHO DE 2010 o racismo é toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública ou privada. O racismo é repudiado na Constituição Federal no art.4º, VIII e foi tipificado como crime através da chamada “Lei Caó”, n. 7.716 de 5 de janeiro de 1989, entre os crimes resultantes de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional também estão previstas dentre as condutas racistas: recusar ou impedir ingresso de aluno em estabelecimento de ensino público ou privado de qualquer grau.

O racismo é elemento estrutural e estruturante da sociedade brasileira e há séculos relega a população negra às piores posições nos indicadores socioeconômicos. Segundo o filósofo e jurista Sílvio de Almeida o racismo é sempre estrutural, ele é um elemento que integra a organização econômica e política da sociedade e é fundante na história deste país com relação direta com o processo de inferiorização, escravização e genocídio das populações negras (Almeida, 2010). Neste sentido, cientificamente, é de conhecimento de todos que estudam e se atentam para o tema que o Brasil, diferente dos EUA onde houve um apartheid racial, é um país construído também por uma ideologia do branqueamento e miscigenação que produziu o “mito da democracia racial”. Mito: pois não se verifica na prática uma democracia racial neste país como bem demonstraram cientistas desde a década de 1970, tais como Kabengele Munanga, Nilma Lino Gomes, Anibal Quijano, Boaventura de Souza Santos, entre outros. O mito da Democracia racial brasileira, nega a existência do racismo no Brasil, escutamos muito que “todos somos iguais”, que o que deveria ter é o “dia da consciência humana”, a despeito das desigualdades motivadas pelo racismo no país e por estruturas racistas culturais, sociais e políticas que privilegiam brasileiros brancos. E ainda, esta conduta só contribui para que se perpetue a naturalização das desigualdades e as violências coloniais que se atualizam nos dias de hoje.

Os dados da desigualdade no Brasil também revelam que não temos igualdade de oportunidades entre negros, indígenas e brancos, mesmo negros sejam a maioria populacional neste país (segundo o último censo do IBGE, 56% da população brasileira seja negra). Dados do Atlas de Violência do Brasil, explicitam que de cada 100 pessoas assassinadas, cerca de 75 são negras. Diante das situações de violência sofridas pela população negra em nosso país, sabemos que a cor chega antes de qualquer ficha criminal ou histórico.

Segundo o mapa do encarceramento, 58,4% da população encarcerada no Brasil é negra. Segundo o IBGE (https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf), 75% da população de baixa renda no Brasil, é negra. Portanto, a ideia de que todos somos iguais serve para a manutenção dos privilégios das pessoas brancas: branquitude – outro conceito teórico difundido nas ciências sociais, bem como aponta a Profª Lia Schucman, uma docente  e pesquisadora desta mesma universidade.

Desde 2008 a UFSC executa programas de ação afirmativa para pessoas negras, indígenas e quilombolas na graduação. Em 2012, com a aprovação da Lei Federal 12.711/12, as cotas passaram a ser obrigatórias para todas instituições de ensino superior. De lá pra cá temos uma universidade mais diversa, com a participação de grupos sociais historicamente privados do direito de estudar em uma instituição federal de ensino. O avanço de ter as cotas na Pós Graduação é resultado de um longo processo de lutas que provocam a pensar que pesquisas temos realizado e para quem. O MEC, pela portaria nº13/2016 dispôs sobre a indução de Ações Afirmativas na Pós-Graduação. Enfim, UFSC por meio deste conselho aprovou, de forma unânime esta política para ser executada a partir de 2021.

Mas, sem coragem para assumir sua posição contrária tais professores preferiram proferir comentários que esboçam o racismo cotidiano e o fazem tranquilamente por meio de e-mails institucionais, o que revela uma das faces do racismo estrutural: o racismo institucional.

Se verificamos institucionalmente o racismo, como não considerar urgente uma medida institucional? Especialmente neste momento histórico e de retrocessos políticos no país. Temos visto no Brasil e no mundo o tema do racismo ganhar maior visibilidade. Além de toda desigualdade histórica e social, pessoas negras e indígenas têm sido mortas diariamente por conta do que o preconceito racial produz. Como se calar diante do racismo dentro desta instituição se o mundo inteiro está debatendo e combatendo tais práticas? Qual o papel desta universidade no enfrentamento a estas desigualdades? O que significa silenciar-se diante de algo que não deve ser visto como “natural”?

Tais comentários se configuram obstacularização de acesso de cunho racial o que não deve ser incentivado pela omissão institucional, por que se espera sanção cabível URGENTE por ser medida de salutar direito e inequívoca Justiça!

Silenciar-se diante do ocorrido é ser conivente com mais uma cena de racismo dentro dessa instituição, especialmente num contexto político de retrocessos e aumento de práticas  que tem levado especialmente pessoas negras e indígenas, cotidianamente a violências simbólicas, morais e físicas.

Com racismo não há diplomacia! Basta de racismo na UFSC!

*Disponíveis em https://rpefloripa.libertar.org/

Bem-vind@s!

02/10/2020 14:27

Bem vindo à página d@s Conselheir@s pela Democracia, um espaço aberto para Representantes das categorias discentes, TAEs e docentes compartilharem com suas bases tudo o que acontece no Conselho Universitário da UFSC.